Teoria da perda de uma chance séria e real. Indenização por oportunidade perdida.
- explicadodireito
- 22 de dez. de 2020
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Atualizado: 5 de mai. de 2021

A perda de uma chance real, uma construção doutrinária orginalmente francesa, é uma corrente teórica que busca reparar o dano causado em razão de uma frustação de expectativa gerada pela conduta omissiva ou comissiva de outrem. Quando alguém impossibilita uma chance séria e real de outra pessoa, que lhe causaria ganhos ou evitaria perdas, de ser realizada, o dano estaria configurado.
Essa nova espécie de dano não se confunde com os já conhecidos danos morais e materiais, esses últimos divididos entre danos emergentes e lucros cessantes. Os danos emergentes são aqueles percebidos no exato momento da ação. Já os lucros cessantes correspondem aos valores que com certeza serão perdidos no futuro em razão do fato ocorrido. Entretanto, o dano causado pela perda de uma chance real não pode se encaixar em nenhuma destas duas espécies, visto que não há certeza se a chance realmente se concretizaria. Tal dano seria intermediário entre ambas as espécies, uma vez que a expectativa foi quebrada no momento da ação, porém o possível dano só aconteceria no futuro.
Um exemplo ajudará na compreensão. O leading case que introduziu tal teoria nos tribunais brasileiros foi o do conhecido “Show do Milhão” do apresentador Silvio Santos. A participante chegou até o estágio final do programa, de forma que se acertasse a resposta da última pergunta levaria para casa o prêmio de um milhão de reais. Foi-lhe perguntado, de acordo com a Constituição Federal, qual seria a porção do território brasileiro destinado aos indígenas, com as seguintes alternativas: 22%, 2%, 4% ou 10%. Acontece que a Constituição Federal não atribuiu nenhum percentual para os territórios indígenas. Sendo assim, neste momento, sua chance de ganhar o prêmio de um milhão foi comprometida, pois não havia nenhuma resposta correta.
A participante optou por parar e levar 500 mil reais para casa. Não conformada, ajuizou ação pleiteando a outra metade do prêmio perdido com base na perda de uma chance real. De maneira equivocada o juízo deu procedência ao pedido da autora e condenou ao grupo Silvio Santos o pagamento de 500 mil reais de indenização à ex-participante. Tal decisão foi reformada, uma vez que a indenização deve ser calculada em razão da chance perdida e não do montante total, pois impossível precisar se de fato a autora acertaria a questão. Arbitrou-se que a chance era de 25%, em razão das quatro alternativas possíveis, e então foi concedida a indenização de 125 mil reais à prejudicada.
Fica claro então que na análise do caso concreto o julgador deve se basear no montante final pretendido e usar da razoabilidade e proporcionalidade para determinar a relevância e seriedade da chance perdida.
Existiram outras situações em que a teoria da chance de uma perda real foi aplicada com sucesso, por exemplo, em demandas trabalhistas em que um ex-funcionário perde uma oportunidade de emprego em razão de documentos retidos com seu antigo patrão, ou ainda no caso de um cidadão que teve sua bagagem extraviada com todos seus documentos e vestimentas, o que lhe impossibilitou participar em estágio final de um concurso público.
O reconhecimento e utilização da teoria da perda de uma chance real possibilita que pessoas que anteriormente simplesmente não teriam seu prejuízo reparado possuam meios para batalhar pelo resguardo de seu bem jurídico colocado em risco.
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